segunda-feira, 21 de maio de 2007

Antero de Quental


Antero de Quental- 1842 - 1891


Bacharel formado em Direito pela Universidade de Coimbra; publicista, homem político, filosofo e poeta. N. em Ponta Delgada a 18 de Abril de 1842, onde também faleceu a 11 de Setembro de 1891. Era descendente duma das mais antigas famílias das ilhas dos Açores, sendo filho de Fernando do Quental.
Depois de estudar as primeiras letras na sua terra natal, veio para Lisboa e cursou as aulas do estabelecimento de ensino fundado e dirigido por António Feliciano de Castilho. Em 1856 foi matricular-se em Direito na Universidade de Coimbra, tomando o grau de bacharel em 1864. Desde 1860 que o jovem poeta se tornara conhecido no mundo literário, com a publicação em opúsculo anónimo, segundo Raymundo Capella, da poesia À historia, cujas estrofes são as que abrem a primeira edição das Odes modernas. Desde esse ano apareceram também várias poesias e artigos de prosa nos jornais Academico, Preludios litterarios, Estreia litteraria, Phosphoro, publicados em Coimbra. Em 1861 saiu dos prelos da Imprensa Literária da mesma cidade, um folheto intitulado Sonetos de Anthero. Em 1863 publicou-se o poemeto Beatrice, e a poesia Fiat lux, que se tornou raríssima, por ter o seu autor inutilizado quase todos os exemplares, poucos dias depois de impressos. Mas em 1865 é que se publicou, também em Coimbra, o volume das Odes modernas, que marcou a Antero do Quental um lugar de destaque nas letras portuguesas. Deste livro se fez segunda edição no Porto em 1875, contendo varias composições inéditas. No Porto também saiu, em 1871, o volume das Primaveras românticas, com o subtítulo de versos dos vinte anos. A série das suas publicações em prosa, encetou-a Antero do Quental em Coimbra, em 1865, com a sua Defesa da Carta encíclica de Sua Santidade Pio IX contra a chamada opinião liberal; este opúsculo tem esta dedicatória: “A todos os católicos sinceros e convictos. A todos os hereges sinceros e convictos. Testemunho de boa-fé.”
Outro opúsculo, publicado no mesmo ano de 1865, é que provocou uma verdadeira tempestade literária, denominada A questão coimbrã. Intitulava-se Bom-senso e bom-gosto; carta ao Ex.mo Sr. António Feliciano de Castilho; reimprimiu-se primeira e segunda vez, contando ao todo três edições. A virulenta e prolongada polémica literária que derivou daquele opúsculo, chegou ao extremo de redundar num duelo à espada entre Quental e Ramalho Ortigão, autor do opúsculo Literatura de hoje. O duelo efectuou-se no Porto, no sítio chamado da Arca de Agua, ficando Ramalho Ortigão levemente ferido num pulso. Ainda em 1865. publicou Antero do Quental em Lisboa, um outro opúsculo A dignidade das letras e as literaturas oficiais, em que atenuou alguns dos exageros da sua apreciação no opúsculo que provocara a questão coimbrã. Volvidas depois as publicas atenções para os factos político-sociais, interveio Antero do Quental nos debates do momento com a publicação dos opúsculos de combate: Portugal perante a revolução de Espanha, considerações sobre o futuro da politica portuguesa? O ponto de vista da democracia ibérica, em 1868; e O que é a Internacional; o socialismo contemporâneo, o programa da Internacional; a organização da Internacional; as conclusões, em 1871, este sem o nome do autor.
Entretanto, promoviam-se em Lisboa, no salão do Casino Lisbonense, as Conferencias democráticas, cujo programa tem a data de 16. de Maio de 1871, e é assinado além de Antero do Quental, por Adolfo Coelho, Augusto Soromenho, Augusto Fuschini, Eça de Queiroz, Germano Vieira de Meireles, Guilherme de Azevedo, Jaime Batalha Reis, J. P. Oliveira Martins, Manuel de Arriaga, Salomão Saragga e Teófilo Braga. As Conferencias democráticas foram inauguradas por Antero do Quental, que também fez a segunda conferência, a qual teve por tema as Causas da decadência dos povos peninsulares nos três últimos séculos. Este notável discurso foi publicado no Porto no mesmo ano de 1871; nele dá Antero do Quental como causas da decadência de Portugal a monarquia e o catolicismo. Proibidas as Conferencias democráticas por uma portaria do então presidente do conselho de ministros, o marquês de Ávila e Bolama, Antero do Quental publicou a sua Carta ao Ex.mo Sr. António José de Ávila, marquês de Ávila, presidente do conselho de ministros, que está escrita com veemência e enérgica indignação.
Afastando-se por essa época da vida publica, após uma viagem aos Estados Unidos, dedicou-se mais especialmente Antero do Quental ás preocupações literárias entrando na nova polémica literária suscitada pela versão do Fausto, de Goethe, pelo visconde de Castilho, desta vez do lado deste e seus amigos e admiradores; dessa época é também o seu opúsculo Considerações sobre a filosofia da história literária portuguesa, em 1872, onde aprecia o livro de Oliveira Martins sobre Camões e os Lusíadas e a Teoria da história da literatura de Teófilo Braga. Em prosa há dispersos por jornais e revistas, muitos artigos dignos de leitura e meditação, como acerca de Lopes de Mendonça, nas colunas duma folha operária do Porto. Deve-se também mencionar os seus manifestos políticos, quando o partido socialista, em 1880, lhe indicou o nome aos eleitores como candidato a deputado por um círculo de Lisboa. Em 1892, o livreiro Gomes, de Lisboa, editou o volume raios de extinta luz, poesias inéditas de Antero de Quental, com outras pela primeira vez coligidas, precedidas de um esboço biográfico por Teófilo Braga. Das suas obras poéticas, além da imitação dum soneto por Manuel del Palacio, traduções em espanhol por Frederico Balart, segundo comunicação de Sanchez Moguel, havendo a Illustracion Española y Americana apresentado já especímenes desta versão; de Manuel Curros Enriquez; e de Baldomero Escobar. Em francês, além de Fernando Leal, traduziram Antero do Quental o autor de Epines et roses, em Gouttes d'Ame, Paris; Achille Millien, em suas Fleurs de poesie, morceaux des poétes étrangers contemporains, traduits en vers; Maxime Formont no capitulo III da sua obra Le Mouvement poéti­que contemporain en Portugal, Lyon, 1892; e H. Faure. Em italiano, contam-se as versões de Marco Antonio Canini, Giuseppe Cellini, Domenico Milelli, E. Teza, G. Zuppone-Strani, com quem colaborou o autor das Fiori d'Oltralpe, onde, além da tradução de varias poesias insere igualmente a versão siciliana Zara, traduzida outrossim em dialecto corso por A. P. Fioravanti; esta poesia, bem como os sonetos A Virgem Santíssima e Quia aeternus, em italiano, foi traduzida outrossim por Prospero Peragallo e Clelia Bertily; desta versão se encontra uma reprodução no livro de António Padula, I nuovi poeti portoghesi, onde também se vê uma tradução Dos Captivos em prosa. Do epitáfio Zara, há também uma tradução em italiano por Francisco Accineili. A edição poliglota Zara (Lisboa, Imprensa Nacional, 1894) compreende traduções em latim, italiano, siciliano, calabrês, napolitano, bolonhês, romanhol, veneziano, veronês. milanês, genovês, romanche, francês, valão, bearnês, delfinês, provençal, e catalão, maiorquino, castelhano, asturiano, mirandês, galego, romeno, polaco, boémio, russo, esloveno, eslovaco, croata, grego, albanês, inglês, sueco, dinamarquês, norueguês, neerlandês, alemão; daco saxónico, bretão, irlandês, daco-cigano, hebraico, árabe, finlandês, húngaro e basco. A estas versões cumpre aditar as posteriores em russo, em eslavo de Montenegro e em arménio antigo e moderno. Das outras obras poéticas de Antero do Quental resta registrar as traduções em inglês pelo Dr. Richard Garnett e por Edgar Prestage, benemérito das letras lusitanas. Em alemão outro benemérito de nossa literatura, Wilhelm Storck, publicou uma versão dos Sonetos de Quental. Em sueco os traduziu Goran Bjorkman, como em dinamarquês recentemente Karl Larsen, professor da Universidade de Copenhaga. Dos escritos em prosa de Antero do Quental há da Carta autobiographica a Storck, versões em alemão e em inglês; e desde 1882 uma tradução espanhola do estudo crítico A poesia na actualidade, traslado devido a Ricardo Caruncho, e impresso em Corunha.
O péssimo estado de saúde de Antero de Quental, a que debalde buscava remédio no conselho das sumidades da ciência médica, como Charcot em Paris, acabara por o obrigar ao retiro de um isolamento completo, em Vila do Conde, onde em 1890, quando se deu o Ultimatum inglês, o entusiasmo da mocidade académica portuense o foi buscar, oferecendo-lhe a presidência da Liga Patriótica do Norte, agremiação oriunda dum comício popular. A Liga Patriótica do Norte, porém, fracassou; e na sequência dos sucessos, veio Antero de Quental a regressar à sua terra natal, onde inesperadamente o público culto foi alarmado pela surpresa da terrível notícia do suicídio do grande poeta. No ano de 1896 apareceu no Porto, editado por Mathieu Lugan, um volume In memoriam, de Antero de Quental, colaborado por alguns dos seus mais íntimos amigos pessoais, trazendo dois apêndices, um de Ernesto do Canto, outro a excelente bibliografia Anteriana, de Joaquim de Araújo.
A este estudo se ligam os opúsculos seguintes: do mesmo Joaquim de Araújo, Bibliographia Antheriana, resposta a alguns reparos do Sr. Delphim Gomes, Coimbra, 1896, e Bibliographia Antheriana, resposta aos Srs. Delphim Gomes e José Pereira Sampaio, Génova, 1897; de Delphim Gomes, Bibliographia Antheriana, notas ao ensaio do Sr. Joaquim de Araújo Coimbra, 1896; Bibliothe­ca Antheriana, defeza dalgumas notas impugnadas pelo Sr. Joaquim de Araújo, Coimbra, 1896, e Bibliographia Antheriana, a propósito da «Resposta» do Sr. Joaquim de Araújo aos Srs. Delphim Gomes e José Pereira de Sampaio, por José d'Azevedo e Menezes, Barcelos, 1897.
Antero Tarquínio de Quental era originário dos Açores, tendo nascido em Ponta Delgada a 18 de Abril de 1842. É possível que a tradição familiar tenha contribuído para a sua inclinação humanística, dado que entre os seus antepassados havia um pregador de mérito, P. Bartolomeu de Quental, e um poeta amigo de Bocage, o avô André Ponte de Quental. Recebeu da família, principalmente de sua mãe, uma educação religiosa e tradicional, que viria a abandonar mais tarde, nos seus aspectos mais visíveis, se bem que tenha conservado até ao fim um fundo de religiosidade.
Frequentou, em 1852, o Colégio do Pórtico, em Ponta delgado, na altura em que Castilho era o seu director. Veio para o continente em 1855, matriculando-se inicialmente no Colégio de S. Bento, em Coimbra, frequentando depois o curso de direito, entre 1858 e 1864. Durante a juventude publicou diversos textos nos jornais "Prelúdios Literários", "O Académico" e "O Instituto".
Em 1861 publicou a primeira obra em livro, Sonetos, seguida nos anos seguintes por Beatrice (1863), Fiat Lux! (1863) e Odes Modernas (1865). Em Coimbra foi presidente de uma organização secreta, de contestação à tradição académica, a "Sociedade do Raio". É também desta época o seu interesse pelas ideias socialistas e pela filosofia. Torna-se um leitor atento de Proudhon e Hegel.
Em 1865 desencadeou uma acirrada polémica com os escritores românticos, ao reagir à carta-prefácio de Castilho que apresentava o livro Poema da Mocidade, de Manuel Pinheiro Chagas. Na sua carta, Castilho criticava os jovens escritores de Coimbra, tendo Antero reagido com o famoso folheto Bom Sendo e Bom Gosto. Num segundo texto, A Dignidade das Letras e as Literaturas Oficiais, defendia a ideia de que a literatura deveria ter uma função social, por oposição ao lirismo ultra-romântico. Ramalho Ortigão envolveu-se também na polémica ao lado de Castilho, tendo mesmo travado um duelo com Antero. A "Questão Coimbrã" marca a entrada em cena de uma nova geração literária, que pretendia demarcar-se da escola romântica — a Geração de 70.
Concluído o curso, Antero voltou aos Açores por pouco tempo, instalando-se depois em Lisboa (1866). Viveu durante alguns meses em Paris, onde trabalhou como tipógrafo. A sua intenção era conhecer de perto o modo de vida das classes trabalhadoras, movido pelos ideais socialistas que então defendia.
Novamente em Lisboa, colaborou com José Fontana na organização de associações operárias e na divulgação das ideias revolucionárias. Nesta fase publicou regularmente textos de carácter político e literário nos jornais "Diário Popular", "Jornal do Comércio" e "O Primeiro de Janeiro". Foi na casa que partilhava com Jaime Batalha Reis que nasceu o chamado grupo do "Cenáculo", espécie de tertúlia onde se discutiam as novas ideias que chegavam de França.



Entre 1870 e 1872, integrou a redacção de jornais de orientação socialista: "A República" e o Pensamento Social". Em 1872 ajudou a fundar a Associação Fraternidade Operária, que era a representante em Portugal da 1ª Internacional Operária.
Dentro do mesmo espírito de intervenção, participou em 1871 na organização das "Conferências do Casino", tendo sido o autor de um dos textos mais célebres dessa série — Causas da Decadência dos Povos Peninsulares nos Últimos Três Séculos.
Em 1973 o pai faleceu e a herança permitiu a Antero viver nos anos seguintes em desafogo económico. Em 1876 faleceu a mãe. Por essa altura já ele era afectado por crises de depressão que ajudam a explicar o abrandamento da sua actividade política e literária. Em 1875 encontramo-lo a dirigir com Batalha Reis a "Revista Ocidental". Os anos seguintes são de pessimismo e desilusão, bem evidentes nos Sonetos Completos (1886).
Em 1881 instalou-se em Vila do Conde e procurou assegurar a educação das filhas de Germano Meireles, após o falecimento do amigo. Os anos seguintes foram de relativa calma, depois da agitação que a depressão lhe trouxe.
Em 1890 presidiu à Liga patriótica do Norte, um dos movimentos nacionais de reacção ao ultimato inglês, que obrigava Portugal a renunciar à ocupação das terras situadas entre Angola e Moçambique. É provável que a constatação do estado de decadência a que o país chegara tenha contribuído para agravar a sua tendência crónica para a depressão. Foi neste ano que publicou na "Revista de Portugal", dirigida por Eça de Queirós, um dos textos mais importantes da filosofia portuguesa — Tendências Gerais da Filosofia na Segunda Metade do Século XIX.
No ano seguinte, regressou aos Açores, suicidando-se a 11 de Setembro (1891).
Obras consultadas:
Breve História da Literatura Portuguesa, Texto Editora, Lisboa, 1999



Bibliografia:
Sonetos, 1861
Beatrice, 1863
Fiat Lux!, 1863
Odes Modernas, 1865
Bom Senso e Bom Gosto, 1865
A Dignidade das Letras e as Literaturas Oficiais, 1865
Defesa da Carta Encíclica de Sua Santidade Pio IX, 1865
Portugal perante a Revolução de Espanha, 1868
Causas da Decadência dos Povos Peninsulares nos Últimos Três Séculos, 1871
Primaveras Românticas, 1872
Considerações sobre a Filosofia da História Literária Portuguesa, 1872
A Poesia na Actualidade, 1881
Sonetos Completos, 1886
A Filosofia da Natureza dos Naturalistas, 1887
Tendências Gerais da Filosofia na Segunda Metade do Século XIX, 1890
Raios de Extinta Luz, 1892



1842:
Em Ponta Delgada, a 18 de Abril, nasce Antero Tarquínio de Quental. A 2 de Maio é baptizado na Igreja Matriz de S. Sebastião de Ponta Delgada. - 1847: Começa a aprender francês com António Feliciano de Castilho que vive nessa altura na capital açoriana. - 1852: Em Agosto vem com sua mãe para Lisboa, matriculando-se no Colégio do Pórtico, do qual Castilho é director. - 1853: Antero regressa a Ponta Delgada onde em 7 de Julho de 1855 concluirá a Instrução Primária. Em 20 de Outubro desse mesmo ano volta a Lisboa onde frequenta o colégio Escola Académica. - 1856: Inscreve-se como aluno interno no Colégio de S. Bento, em Coimbra. Escreve os primeiros versos que lhe são conhecidos numa carta enviada a seu irmão André. - 1858: Após algum tempo de estudo em Lisboa, com a ajuda de seu tio paterno Filipe de Quental, lente de Medicina, conclui os estudos preparatórios para o ingresso na Universidade de Coimbra, onde se matricula no 1º ano de Direito em 28 de Setembro, sendo admitido a 2 de Outubro. - 1859: Em Abril é condenado pelo Conselho de Decanos a oito dias de prisão por, com outros estudantes, ter tomado parte num acto praxístico - armado de um cacete e com o rosto coberto, «dando grau a caloiros e cortando-lhes o cabelo». Em 24 de Maio é aprovado no acto do 1º ano de Direito. Em Setembro matricula-se no 2º ano de Direito. - 1860: Mora no Largo da Sé Velha, ficando também por vezes em casa de seu tio Filipe de Quental, na Travessa da Couraça. Em Janeiro publica nos Prelúdios Literários «Na Sentida Morte do Meu Condiscípulo Martinho José Raposo». Em Janeiro, Fevereiro, Novembro e Dezembro, também nos Prelúdios, publica «Leituras Populares». Em Março, com Alberto Sampaio, Alberto Teles e outros, dirige o jornal O Académico - Publicação Mensal, Científica e Literária. - 1861: Em Abril participa na fundação da Sociedade do Raio, uma sociedade secreta que se caracteriza por lançar desafios blasfemos a Deus durante a ocorrência de trovoadas. Em O Fósforo, publica um artigo sobre João de Deus: «A Propósito de um Poeta». Em Outubro matricula-se no 4º ano. - 1862: Em 21 de Outubro saúda, em nome da Academia, o príncipe Humberto de Sabóia. - 1863: Em 22 de Julho faz exame e passa para o 5º ano. - 1864: Em 2 de Julho conclui o curso de Direito. 1866: Em Janeiro tenta alistar-se no exército de Garibaldi. - 1867: Em 19 de Agosto embarca para Ponta Delgada. - 1868: Em 31 de Outubro regressa a Lisboa. 1869: Em Julho embarca para os Estados Unidos. - 1871: Em 22 de Maio as Conferências são inauguradas. - 1874: Adoece gravemente em Ponta Delgada. - 1876: Em Maio desloca-se a Ponta Delgada, regressando em Julho a Lisboa. - 1877: No início de Julho faz uma viagem a Paris, onde consulta o Dr. Charcot. - 1878: Entre Fevereiro e Junho hospeda-se em casa de Oliveira Martins, no Porto. - 1880: Em fins de Maio, numa carta a Alberto Sampaio inclui o soneto «Estoicismo». - 1882: Em Maio escreve os sonetos «Na Mão de Deus» e «Evolução». - 1883: Em Maio escreve o soneto «Voz Interior». - 1884: No Palácio de Cristal, no Porto, encontra-se com Eça de Queirós, Guerra Junqueiro, Oliveira Martins e Ramalho Ortigão. Tiram a fotografia do «grupo dos cinco». - 1885: Encontra-se Com Carolina Michaëlis. - 1886: Perto do fim do ano recebe a primeira carta de Wilhelm Storck com sonetos seus traduzidos para o alemão. - 1887: Em 8 de Maio desloca-se a Ponta Delgada. - 1888: Pensa candidatar-se a uma cadeira da projectada Escola Normal Superior. - 1889: Columbano pinta-lhe o retrato que se conserva no Museu do Chiado. - 1890: Em 11 de Janeiro - Ultimato inglês. - 1891: Jantar de despedida, oferecido pelos Vencidos da Vida no Tavares. Em 5 de Junho parte para Ponta Delgada. No dia 11 de Setembro compra um revólver e, às 20 horas, no lado norte do Campo de S. Francisco, suicida-se com dois tiros.
O Palácio da Ventura Sonho que sou um cavaleiro andante.Por desertos, por sóis, por noite escura,Paladino do amor, busca anelanteO palácio encantado da Ventura! Mas já desmaio, exausto e vacilante,Quebrada a espada já, rota a armadura...E eis que súbito o avisto, fulguranteNa sua pompa e aérea formosura! Com grandes golpes bato à porta e brado:Eu sou o Vagabundo, o Deserdado...Abri-vos, portas d'ouro, ante meus ais! Abrem-se as portas d'ouro, com fragor...Mas dentro encontro só, cheio de dor,Silêncio e escuridão -- e nada mais! No Turbilhão A Jaime Batalha Reis No meu sonho desfilam as visões,Espectros dos meus próprios pensamentos,Como um bando levado pelos ventos,arrebatado em vastos turbilhões... Num espiral, de estranhas contorções,E donde saem gritos e lamentos,Vejo-os passar, em grupos nevoentos,Distingo-lhes, a espaços, as feições... - Fantasmas de mim mesmo e da minha alma,Que me fitais com formidável calma,Levados na onda turva do escarcéu, Quem sois vós, meus irmãos e meus algozes?Quem sois, visões misérrimas e atrozes?Ai de mim! ai de mim! e quem sou eu?!... Aspiração Meus dias vão correndo vagarosos,Sem prazer e sem dor pareceQue o foco interior já desfaleceE vacila com raios duvidosos. É bela a vida e os anos são formosos,E nunca ao peito amante o amor falece...Mas, se a beleza aqui nos aparece,Logo outra lembra de mais puros gozos. Minha alma, ó Deus! a outros céus aspira:Se um momento a prendeu mortal beleza,É pela eterna pátria que suspira... Porém, do pressentir dá-ma a certeza,Dá-ma! e sereno, embora a dor me fira,Eu sempre bendirei esta tristeza! O QUE DIZ A MORTE «Deixai-os vir a mim, os que lidaram;Deixai-os vir a mim, os que padecem;E os que cheios de mágoa e tédio encaramAs próprias obras vãs, de que escarnecem... Em mim, os Sofrimentos que não saram,Paixão, Dúvida e Mal, se desvanecem. As torrentes da Dor, que nunca param, Como num mar, em mim desaparecem.»
- Assim a Morte diz. Verbo velado,
Silencioso intérprete sagrado
Das coisas invisíveis, muda e fria,
É, na sua mudez, mais retumbante
Que o clamoroso mar; mais rutilante,
Na sua noite, do que a luz do dia.
Nirvana
Para além do Universo luminoso
Cheio de formas, de rumor, de lida,
De forças, de desejos e de vida,
Abre-se como um vácuo tenebroso.

A onda desse mar tumultuoso
Vem ali expirar, esmaecida...
Numa imobilidade indefinida
Termina aí o ser, inerte, ocioso...

E quando o pensamento, assim absorto,
Emerge a custo desse mundo morto
E torna a olhar as coisas naturais,

A bela luz da vida, ampla, infinita,
Só vê com tédio, em tudo quanto fita,
A ilusão e o vazio universais.
Mors-Amor
Esse negro corcel, cujas passadas
Escuto em sonhos, quando a sombra desce,
E, passando a galope, me aparece
Da noite nas fantásticas estradas,
Donde vem ele? Que regiões sagradas
E terríveis cruzou, que assim parece
Tenebroso e sublime, e lhe estremece
Não sei que horror nas crinas agitadas?
Um cavaleiro de expressão potente,
Formidável, mas plácido, no porte,
Vestido de armadura reluzente,
Cavalga a fera estranha sem temor:
E o corcel negro diz: "Eu sou a Morte!"
Responde o cavaleiro: "Eu sou o Amor!"
A um poeta
Tu, que dormes, espírito sereno,
Posto à sombra dos cedros seculares,
Como um levita à sombra dos altares,
Longe da luta e do fragor terreno,
Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno,
Afuguentou as larvas tumulares...
Para surgir do seio desses mares,
Um mundo novo espera só um aceno...
Escuta! é a grande voz das multidões!
São teus irmãos, que se erguem! são canções...
Mas de guerra... e são vozes de rebate!
Ergue-te pois, soldado do Futuro,
E dos raios de luz do sonho puro,
Sonhador, faze espada de combate!

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